segunda-feira, 30 de abril de 2007

Minha filha

No orkut, entrei em uma comunidade: "Saudade de um tempo não vivido". Para pessoas de 20 anos que gostariam de ter ido aos Festivais da Canção da Record, assistido a Elis ao vivo, ter uma juventude engajada, uma economia crescente, poder andar a noite no centro de SP, usar vestidos rodados de bolinhas, ter sido hippie e viver na comunidade da Baby Consuelo/do Brasil, ou namorar rapazes de topetes e lambretas, essas coisas de 50, 60, 70.

Bem, mas a real é que me entristeço, porque eu queria cantores, compositores, escritores, poetas que representassem a minha geração. Queria muito me sentir representadas com as aflições que tenho hoje.

Por isso me encantei com Fabricio Carpinejar, que conheci através do blog do Marcelo Coelho da Folha. O poeta acaba de lançar o livro Meu filho, minha filha. Só vi uns trechinhos no site, mas já fiquei com apetite de descobrir mais sobre ele.

Ele fala sobre um amor paterno muito atual. De um homem sensível e fragilizado, que vive distante dos filhos devido a separação da esposa, com saudade, remorço, e com um pires na mão pedindo migalhas de carinho e atenção dos filhos adolescentes.

Tem uma riqueza de imagens de tirar o fôlego. Emocionante e me faz lembrar com um tanto de dó do meu pai. Vem umas imagens dele tão pequeno, um dia em que ele chorou na minha frente (achava que pais não chorassem), pedindo colo, proteção, perdão. Depois, ele ontem em casa andando atrás da gente, contando do ex-marido de uma amiga que estava doente e que os filhos não iam ver. Parecia ter medo de ser abandonado, por não ser bem aquilo que eu queria que fosse, ou que eu precisasse que fosse.

Ah, sim, uns versos paternais do Carpinejar:

"Nem todos os pais podem dormir com seus filhos na mesma casa em que vivem. Como eu, alguns pais são separados, que dispõem apenas de um sábado e domingo para confirmar a paternidade e reencontrar o significado da família. Pai separado sempre está sob a ameaça de despejo. De ser trocado. Ou de ser esquecido".

Corto tuas unhas e reclamas/ que aparo muito rente da pele./Desculpa, tudo que vivi foi rente à pele.//...Eu te alfabetizei e foste/me tirando o espaço entre as linhas./Guarda-me apenas uma fresta.//Não importa o que os adultos falam,/serei o pai da insistência./Até onde posso ir para te resgatar?//Reclamas do teu pai, como se ele tivesse/ condições de se inventar de novo./Desculpa, corto as palavras/ muito rente da pele,/assim como descascava maçã e levava com a faca/ uma lasca por vez em sua boca.//Tudo o que vivi foi rente à pele./Deixei de ser pai e virei a pensão da tua mãe./Não esqueço o dia em que o oficial de justiça/bateu à minha porta a cobrar/ o que já concedia naturalmente./No papel timbrado, teu nome contra o meu.//O nome que escolhi contra o meu./O nome que sonhei contra o meu./Fui teu primeiro réu, sem que tu soubesses.

Quando brinco com as crianças// e faço palhaçada, elas se divertem,/menos tu//Tantas vezes ouvi tua vergonha/ explicando aos colegas,/com os olhos virados para cima:// 'Meu pai é louco'./Louco por quem? Já perguntaste?

2 comentários:

Anônimo disse...

Tenho admiração por muita coisa daquela época - foi um período mesmo muito rico, na música principalmente -, mas admito não ser muito chegado nessa história de saudosismo, não...

E eu não queria, de jeito nenhum, ter vivido a época da ditadura, por exemplo. Até porque, se assim tivesse sido, talvez eu não estivesse aqui hoje. Credo.

Anônimo disse...

A saudade é mais na parte artística mesmo, principalmente dos Festivais. Tb não queria ditadura não. Deus nos livre!